quinta-feira, 21 de março de 2013

O jornalista e a crônica em Mário Pereira

MÁRIO, uma semana antes de lançar novo livro, voltou aos tempos de
professor. Papo aconchegante sobre Jornalismo e Literatura na UNISUL
Sr. Ernesto, disseram-lhe em Cuba há alguns anos, é descendente direto da família de felinos que conviveram com o escritor Ernest Hemingway. Mário Pereira não caiu na "pilantragem", mas também não resistiu à compra do bichano quando visitara o Museu Hemingway, sítio que servia de refúgio para o romancista estadunidense na ilha caribenha. Finca Vigia, nos arredores de Havana, preserva objetos pessoais de Hemingway e as fontes de inspiração para o livro que lhe rendeu o Prêmio Pulitzer e o Nobel de Literatura: O Velho e o Mar

--- Vocês já leram? Não, é? Ah, vocês têm que ler!

O tom de voz era o de um conselho paterno, firme e contundente. Daqueles que sugerem caminhos e alertam para os riscos de não trilhá-los.

--- Foi a melhor experiência de leitura que eu tive.

Mário Pereira lecionou redação jornalística na Universidade do Sul de Santa Catarina por alguns anos. Organizou e publicou três livros de crônica com textos produzidos pelos estudantes na disciplina; descobriu talentos cujos nomes ainda guarda. Alguns deles são colegas próximos de profissão. Estar novamente com estudantes de Jornalismo, ainda que por breves duas horas, fora como pinçar da cabeleira branca fios adequados a uma tecitura apaixonada sobre o ofício e a literatura. A memória não lhe falha. Mas, como na prosa de todo o bom contador de histórias, há sempre uma pitada aqui e ali de adequação criativa ao contexto.

A quinta-feira, 14 de março, em que matou saudades dos tempos de professor, antecedera em uma semana ao lançamento do seu décimo livro: Roteiro Histórico e Sentimental pelas Ruas de Florianópolis. As histórias foram inspiradas nos personagens que deram nome às ruas ou em situações vividas pelo autor nas suas andanças. Florianópolis, aliás, estava nos planos só por alguns anos, enquanto o desafio de fazer parte do "primeiro jornal informatizado do Sul do mundo" não fosse vencido. E lá se vão quase 30, depois de aceitar o convite para trabalhar no Diário Catarinense, do Grupo RBS, e passar por outras redações de jornal.

Por acaso entrou no Jornalismo; a crônica vem do gosto pela literatura. Mário Pereira, enquanto jornalista e escritor, achou no limite tênue que o gênero oferece ao registro do cotidiano um lugar confortável. 

--- A crônica tem sempre um pé fincado na realidade, mas com a porta aberta para a criatividade.

Sua paixão é escrever, expressar uma certa "interpretação artística da realidade". Tem planos de produzir semanalmente para o jornal perfis de pessoas comuns de Florianópolis, de concluir um livro sobre "elementos de redação jornalística" e outro de contos, este na sequência do recém lançado. Há 10 anos trabalha num romance histórico sobre a Porto Alegre do Século XIX em que emprestará aos personagens principais os perfis de seus familiares.

Está afastado da produção jornalística por opção. Trabalha em casa os artigos de opinião e editoriais para o DC. Crítico das redações excessivamente tecnologizadas, Mário vê na acomodação um certo risco ao ofício. Como "escritores da realidade" e "historiadores do presente", os jornalistas dependem da observação atenta ao que os cerca.

--- Quando era editor-chefe no Jornal O Estado, eu não deixava ninguém na redação. Vão procurar o que fazer na rua, eu dizia. A redação é só pra produzir textos.

Pés fincados na realidade e portas abertas
para a criatividade. É o cronista
Aos estudantes de Jornalismo sobraram dicas: de livros, de posturas, de fundamentos para bons textos. As indicações de livro talvez cheguem aos seis quilos da edição dominical do New York Times, um dos prediletos de Mário Pereira. O Velho e o Mar foi só uma das referências; tem também O Livro da Vida, Fama e Anonimato… … … Escrever sem uma boa gramática e um bom dicionário para pronta consulta é inadmissível… … … Clareza, fluência e simplicidade são indicadores de boas prosas; criatividade, aliás, diz Mário, é simplicidade… … … 

--- É preciso decifrar esse mundo louco, não se contentar com coisa feita, buscar a própria interpretação.

Mário Pereira é imortal. Em outubro de 2009 foi eleito para ocupar a Cadeira 8 da Academia Catarinense de Letras, que pertenceu ao antropólogo Sílvio Coelho dos Santos. Os "chás divertidíssimos" com a "vida inteligente" estão na rotina, são um estímulo para "continuar aprendendo e produzindo". 

E sua obra reserva um lugarzinho para o Sr. Ernesto, Ernesto Hemingway, "um gato fantástico" que já era conto antes mesmo de Mário dedicar a ele sua prosa elegante e refinada.


Ouça a palestra de Mário Pereira na íntegra

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