quinta-feira, 14 de março de 2013

Fernando Evangelista, um Jornalismo

EVANGELISTA e o diálogo generoso com a primeira fase de Jornalismo
da UNISUL, Pedra Branca. As qualidades de um bom texto e de um bom
profissional não estão diretamente ligadas ao vínculo com a grande mídia
Eram olhos e ouvidos sábios, curiosos, características que Fernando Evangelista imputa como necessárias aos bons jornalistas. Carlos Pianta quebrou a sintonia ao abrir a porta, com a desculpa de estar procurando a turma com quem teria aula naquela quarta-feira, 6 de março. Descobriu-se depois que Pianta queria mesmo era conhecer a primeira fase do curso de Jornalismo da Universidade do Sul de Santa Catarina e alertar para o trote aos calouros nos próximos dias. Veterano de curso e de andanças políticas, fora entrevistado para documentário produzido pela produtora de Fernando, a Doc Dois Filmes, sobre a manifestação dos estudantes em 2010 contra o aumento das tarifas de ônibus em Florianópolis. Os dois cumprimentaram-se afetuosamente, Pianta desculpou-se e seguiu seu rumo. Fernando retomou o da turma.

Formado em Jornalismo pela UNISUL, Fernando Evangelista tem no currículo marcas de uma profissão cujo sentido independe dos vínculos formais com a grande mídia. Em regiões de conflito, inscreveu nome e sobrenome no lado oposto ao das assinaturas sem certidão que costumam ilustrar as reportagens oficiosas. Ele é tão anônimo para o Jornalismo de pedigree quanto os personagens que costuma descrever em suas matérias. O lugar que ele ocupa é o que escolheu desde os tempos de faculdade e vem consolidando desde o momento em que pôs a mochila e saiu a viajar, com o diploma ali, guardadinho.

--- Eu virei meio que um especialista em confusões.

A reunião do G-8 em 2001 na cidade de Gênova, a Operação Escudo Defensivo na Palestina no ano seguinte, a guerra no Iraque em 2003, no Líbano em 2006, e o conflito entre Curdos e Turcos em 2007 estão na bagagem de reportagens especiais para a Revista Caros Amigos. Reportagens sobre o Movimento dos Sem Terra e produções audiovisuais em defesa dos direitos humanos lhe renderam prêmios. Hoje dedica-se à produção de documentários com a "parceira de projetos e de aventuras", a também jornalista Juliana Kroeger, com quem é casado. Foi professor de Jornalismo na Estácio de Sá e se prepara agora para dar aulas na UNISUL, na Grande Florianópolis.

Ferreira Gullar o convenceu com um poema de que Jornalismo era a escolha certa. Fernando Evangelista carrega a vida que bate como epígrafe de uma trajetória profissional pautada em alternativas ao modelo de negócios que ainda sustenta a indústria jornalística.

--- Hoje não é mais necessário uma grande empresa para nos sustentar e para que sejamos ouvidos. Isso acabou!

Não significa que Fernando vire as costas para exemplos oferecidos pela chamada grande impensa aos que ainda degustam boas histórias em bons textos jornalísticos. Carlos Wagner, Eliane Brum, José Hamilton Ribeiro e Caco Barcelos, para citar só alguns, são nomes que sustentam seus argumentos. 

A conversa com os estudantes recém chegados à vida universitária foi planejada a partir de uma pergunta inspiradora: como escrever um bom texto jornalístico? E a resposta, dada num diálogo generoso, desenhou-se sobre algumas qualidades que Fernando considera essenciais: ser curioso, saber ver e saber ouvir para produzir textos com precisão, foco, clareza e força.

Jornalismo Gonzo, New Journalism, flânerie... Evangelista foi acrescentando elementos típicos dos estudos que orientam a formação profissional no contexto do portfolio construído ao longo da própria carreira. Mas a produção de bons textos não tem, insistiu o jornalista, segredo:

--- Escreve bem quem lê bastante.

E a leitura de que fala tem abrangência. É leitura também de mundo, algo que se amplia com o interesse por boas histórias e o respeito para com a melhor versão possível da verdade.

--- É preciso desenvolver um olhar insubordinado, não acomodado sobre as coisas. Eliane Brum é a jornalista mais premiada no Brasil não só porque tem um bom texto; os prêmios vêm das boas pautas que ela levanta. E ela faz isso desde o início da carreira.

A fome de vida que Ferreira Gullar despertou no jornalista é hoje o que também embasa seus argumentos sobre o ofício. A graduação em Ciências Socias pela Universidade Federal de Santa Catarina e o mestrado em Jornalismo e Comunicação pela Universidade de Coimbra, em Portugal, são complemento importante para as leituras de mundo em Fernando. Mas para o jornalista, a inspiração não vem do que o sacia; vem da fome.



Ouça a íntegra do diálogo entre Fernando e os estudantes de Jornalismo da Unisul

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